Símbolo de vitória por direitos humanos, Jéssica agora teme o novo coronavírus

Manicure, que hoje mora em um cortiço na região central de São Paulo, ficou famosa por ter ficado presa com seu bebê

São Paulo

As imagens com o filho recém-nascido no colo, no fundo de uma cela, durante a amamentação, transformaram a manicure Jéssica Monteiro, então com 24 anos, em um símbolo da violação aos direitos humanos nas cadeias brasileiras há dois anos. Ela havia acabado de dar à luz o segundo filho, Henrico, e cumpria prisão preventiva por, segundo os policiais, ter consigo 90 gramas de maconha.

Nesta semana, a reportagem a encontrou, por acaso, morando em um cortiço no cruzamento da rua João Teodoro com a avenida do Estado (região central de São Paulo), na margem esquerda do rio Tamanduateí.

Jéssica cumpre prisão domiciliar, benefício que, a partir da repercussão provocada por seu caso, foi estendido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em fevereiro de 2018 a outras detentas em prisão preventiva com filhos menores de 12 anos. “Muitas mães foram ajudadas, depois do que aconteceu comigo. Vi pela internet”, diz.

A manicure Jéssica Monteiro, 26 anos, com a filha Sofia, 2 meses. Em 2018, ela ficou em uma cela no 8 DP (Brás) com o filho recém-nascido, Henrico - William Cardoso/Folhapress

A família de Jéssica aumentou recentemente. Há dois meses nasceu Sofia, a sua terceira filha. Henrico já tem dois anos e é uma criança saudável. Ao lado de Kauã, 5, e do marido, entregador desempregado, ela divide um quarto apertado e teme a pandemia do novo coronavírus. “A gente toma mais banho, usa máscara, não pode descuidar. Não temos muito recurso. Se adoecer, não tem como pagar hospital”, conta.

O medo do coronavírus não é absurdo. O cunhado de Jéssica morava no cortiço, morreu há duas semanas e o atestado de óbito traz parada cardíaca como causa. Os sintomas eram, porém, parecidos com a Covid-19. “Ele falou para a gente que estava com febre, dor no corpo e dificuldade para respirar”, diz.

Em meio à pandemia, o cortiço recebeu a visita de Policiais Miliares recentemente. Todos ficaram apreensivos, temendo uma abordagem truculenta, como já ocorreu no passado. “Surpreenderam a gente. Eles tiraram duas cestas básicas e disseram que, se a gente passasse por dificuldade, poderíamos contar com eles.”

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