Samba dá lugar a ações sociais nas quadras das escolas de SP

Em meio à pandemia, agremiações decidiram adiar a preparação dos desfiles de Carnaval 2021

São Paulo

Fim de julho, início de agosto. Em tempos normais, as escolas de samba de São Paulo já estariam lotando suas quadras para escolher o samba do Carnaval do ano seguinte e os barracões já estariam começando a preparar fantasias e alegorias. Mas em tempos de pandemia do coronavírus e com os desfiles adiados para maio de 2021, algumas decidiram adiar a escolha do samba e priorizar o social, transformando as quadras em ponto de distribuição de refeições, cestas básicas, aplicação de vacinas e até para testar a Covid-19.


Campeã do Grupo de Acesso neste ano, a Vai-Vai esperava voltar com força total em 2021 para o Grupo Especial. Mas sem uma nova data para os desfiles, a Saracura preferiu esperar e manteve apenas alguns dos atendimentos sociais na quadra da escola, na Bela Vista, região central, como a distribuição de leite.

A escola de samba Dragões da Real aproveita a falta de atividade na quadra para preparar refeições e lanches para moradores de rua; na foto Ubaldo Vieira, diretor do departamento social da escola - Rubens Cavallari/Folhapress


“Não temos condições de planejar nada diante da situação que estamos passando. Temos três ideias de enredo que estão guardadas para saber qual será o tamanho do nosso Carnaval. Certamente, se não tivesse a pandemia, o samba já estaria definido, e o carnavalesco trabalhando as fantasias”, disse a presidente da Vai-Vai, Anna Maria Murari.


A Imperador do Ipiranga também decidiu esperar. Segundo o presidente da agremiação, Rodrigo Souto, a ordem é ajudar a quem precisa. “Até temos o enredo, mas qualquer ação do Carnaval agora ficará para segundo plano. Não há como pensar em festa com pessoas morrendo ou passando fome”, afirmou.


Desde 8 de maio, a quadra da escola, no Ipiranga, zona sul da capital, é o ponto de distribuição de 200 marmitas por dia para moradores da favela de Heliópolis, a maior de São Paulo. As refeições são preparadas pela chef Telma Shiraishi, do restaurante Aizomê. Ao todo, já foram doadas quase 18 mil refeições, além de distribuição de kits de higiene e realização de campanha de vacinação contra a gripe.


A Império da Casa Verde também decidiu não preparar nada para o Carnaval de 2021. Para o vice-presidente Fabio Leite de Sousa, o Fabinho, a prioridade neste momento de pandemia é preservar vidas. “Nós fomos taxativos em defender o adiamento dos desfiles se não tivesse uma vacina contra o coronavírus. Nossa prioridade é a saúde de todos os componentes”.


Sem poder se reunir na quadra, a Império da Casa Verde decidiu investir em lives para manter a comunidade ativa. Desde o início da quarentena, já foram mais de 25 reuniões pela internet, além de várias ações para arrecadar e doar alimentos à comunidade.

Apoio da comunidade garante doações e trabalho no barracão

Sem poder se reunir para escolha de samba e futuros ensaios, a quadra da Dragões da Real, na Vila Anastácio, na Lapa, zona oeste da capital, transformou-se em uma grande cozinha para preparar refeições e lanches para moradores de rua.


“São 150 marmitas preparadas todas as sextas-feiras, além de doação de roupas e kits de higiene”, disse o diretor do departamento social, Ubaldo Vieira. O diretor de Carnaval da Dragões, Marcio Santana, disse que, em paralelo às ações sociais, a escola conseguiu decidir o tema do Carnaval 2021 e começar a preparar o piloto das fantasias no barracão. Graças ao projeto de adoção de profissionais, a escola mantém sete funcionários trabalhando nas fantasias e alegorias no barracão.


A Gaviões da Fiel também conseguiu adiantar a produção do Carnaval enquanto a quadra é usada para receber e distribuir alimentos, roupas, kits de higiene e cestas básicas. A escola já doou 4.000 cestas básicas.


Já a Mancha Verde está com o enredo e a sinopse de Carnaval prontos, segundo o carnavalesco Jorge Freitas. No barracão, cinco pessoas trabalham no piloto dos figurinos. “Temos que separar a produção da festa”, afirmou.

Agremiações promovem ações na saúde

A escola de samba Águia de Ouro, campeã do Carnaval deste ano, trocou os encontros na quadra para celebrar o título inédito por ações sociais e na área da saúde para atender às necessidades da comunidade.


Além da arrecadação e distribuição de máscaras, cestas básicas e kits de higiene e limpeza, a escola conseguiu parcerias para fazer atendimento psicológico online. Segundo a diretora de comunicação da Águia de Ouro, Jacque Meira, 90 pessoas passaram com psicólogo até 30 de abril, e 68 continuam com o tratamento no momento.


A escola de samba Vila Maria também decidiu que a prioridade é a saúde nesta pandemia. Em uma parceria com a Secretaria Municipal de Saúde, a escola cedeu suas costureiras para produzirem aventais e máscaras que foram utilizadas por médicos e enfermeiros da rede municipal.


Outra ação da Vila Maria, também em parceria com a secretaria, foi a realização de mil testes gratuitos da Covid-19 na quadra da escola. “Lançamos a campanha dos testes pelas redes sociais da escola. Em 48 minutos esgotamos as mil senhas. Agora temos fila de espera para fazer o teste!”, afirmou o diretor de comunicação, Fabio Fávero.

Encontros virtuais reúnem comunidade pela internet

Sem poder se reunir para as tradicionais feijoadas aos sábados e os encontros para selecionar o samba-enredo, as escolas aderiram às “lives”, as tão populares chamadas de vídeo ao vivo pelas redes sociais.


As reuniões por vídeo chamada também estão usadas para as audições de escolha do samba. É assim na Mocidade Alegre. Segundo a presidente Solange Cruz, a escola já recebeu 42 sambas com o tema da cantora Clementina de Jesus, enredo que a escola vai defender em 2021.


“Estamos fazendo as audições da fase eliminatória sem encontros físicos. A ideia é lançar o samba-enredo em uma nova ‘live’ entre o fim de agosto e início de setembro”, afirmou.

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