Descrição de chapéu Centro Coronavírus

Crise aumenta e muda a cara do centro de SP em um ano de Covid

Retrato é de comércio fechado, aumento de sujeira e miséria; Santa Ifigênia destoa com aglomeração

São Paulo

O tímido processo de revitalização iniciado na década passada na região central de São Paulo sofreu um duro golpe com a pandemia e o cenário para quem ainda caminha por suas ruas é desolador.

Comércios com portas entreabertas ou placas de aluga-se penduradas nas fachadas, bares e restaurantes com faixas zebradas, cadeiras e mesas nas portas, pontos de descarte de entulho ainda mais visíveis sem o tumulto rotineiro e a miséria que envolve milhares de paulistanos arrastados para a vida nas ruas são o retrato do centro após um ano de Covid-19.

Andar pelo “centrão” em um dia útil na fase crítica da pandemia é cruzar com pessoas abatidas pela situação atual. De comerciantes a quem não tem um teto para se abrigar, todos estão descontentes e sem esperança.

Homem observa o lixo acumulado na avenida Ipiranga com a Cásper Líbero, em frente à praça Alfredo Issa, na região central de SP - Rubens Cavallari/Folhapress

José Armando Mascigrande, 67 anos, cuida da loja de malas fundada pelo avô em 1905, na avenida São João. Para ele, a pandemia foi uma paulada na chance de recuperação. “Acho que o centro não tem mais conserto. O gráfico agora é só para baixo”, diz. “Não vejo mais um restaurante bom”, conta, citando como exemplo vizinhos que fecharam as portas no Anhangabaú.

O ajudante de cozinha Atanailton de Jesus Duarte, 60 anos, foi demitido de um restaurante em Pinheiros (zona oeste), conta que vive há um ano em um quarto de hotel pago pela prefeitura para pessoas em situação social precária e lamenta o que vê na região central. “Tem muita gente [vivendo] na rua e muitas portas fechadas. A cada dia que passa, a situação só piora. Dá muita tristeza, vontade de ir embora”, afirma. Também sobra desemprego. “Já botei currículo, mas até agora nada.”

A Santa Ifigênia não parou, apesar das restrições impostas pelo Plano São Paulo. Mas está longe de ser um bom exemplo. Uma multidão ainda se aglomera no meio da rua e nas calçadas, com os comércios com portas entreabertas. “As pessoas não usam máscara, está sempre lotado. Muito movimentado”, afirma o atendente Kleber Leandro Batista, 28 anos, que trabalha no local.

Desempregada, Alessandra Anselmo, 50, ganhou a companhia do filho, César Henrique Anselmo Dourado, 26, ao vender lanches para funcionários de uma empresa de telemarketing no famoso cruzamento da Ipiranga com a São João.

Os dois já moraram no centro há mais de 10 anos, vivem atualmente no Chora Menino, em Santana (zona norte), e hoje lamentam a sujeira nas ruas e o abandono social. “Para quem tem uma casa para morar, é mais fácil. Agora, para quem está na rua é complicado. As pessoas os desprezam”, diz. “O que falta é oportunidade. Se tiver, tudo vai ser diferente”, diz o rapaz. “Tem tanto prédio abandonado. Poderiam abrigar quem não tem onde morar”, afirma a mãe.

Urbanista diz que agravamento da crise social é preocupante

A urbanista Lucila Lacreta, que é diretora executiva do Movimento Defenda São Paulo, afirma que o agravamento dos problemas sociais é o que mais preocupa no momento e precisa de atuação presente do poder público e da população como um todo.

“A questão da pobreza vem de forma avassaladora. Tanto governo quanto a sociedade precisam atuar. Não tem para onde essas pessoas irem. É abrigar e ajudar. A fome está piorando a cada dia.”

A urbanista explica que a situação social e sanitária mudou demais com o esvaziamento das atividades comerciais e de serviços na região central. “Isso é extremamente preocupante, porque o centro sempre foi bastante pujante. Com tudo fechado, as pessoas em situação de rua não têm mais como se sustentar, como fazer um bico”, diz.

A diretora do Movimento Defenda São Paulo também diz que não dá para prever o que ocorrerá após a pandemia, porque os setores público e privado estão sem recursos, assim como grande parte da população, que perdeu renda e capacidade de financiamento. “Primeiro o incêndio [pandemia] tem que acabar, depois cuidar do rescaldo. Não dá para fazer exercício de futurologia no momento.”

Movimentação na rua Santa Ifigênia, na região central de SP - Rubens Cavallari/Folhapress

Resposta

A Prefeitura de São Paulo, gestão Bruno Covas (PSDB), diz que desde o início da pandemia tem desenvolvido uma uma série de ações que vão do assistencial ao econômico para minimizar os impactos na população paulistana. Na região central há 85 serviços da rede socioassistencial com 25.685 vagas, entre serviços da Proteção Social Básica, que contempla os equipamentos para convivência e fortalecimento de vínculos e Proteção Social Especial, que atua na garantia de direitos e no acolhimento socioassistencial.

Também criou o Programa Ação Vidas no Centro, por meio das Secretarias Municipais de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo e Assistência e Desenvolvimento Social, teve início em abril de 2020 com a oferta de sanitários, banhos e lavanderias para pessoas em situação de vulnerabilidade social na região central, incluindo o Triângulo SP. O objetivo é minimizar o impacto da proliferação do coronavírus entre a população em situação de vulnerabilidade social nesta área da cidade. Já foram realizados 1.596.485 atendimentos em cinco estações referentes ao uso de banheiros e banhos e 24.019 usos das lavanderias, totalizando 1.620.504 atendimentos. Atualmente, os pontos da Ação Vidas no Centro estão na praça da República, praça da Sé, parque Dom Pedro, praça Júlio Prestes e largo do Paissandu.

Também diz que adotou diversas ações para auxiliar o setor produtivo da cidade, como a prorrogação da validade de certidões municipais; suspensão dos pagamentos dos tributos municipais do Simples Nacional para Microempresas, Empresas de Pequeno Porte e Microempreendedores Individuais (MEIs); suspensão da inclusão de novos apontamentos no Cadastro de Inadimplentes (Cadin); e suspensão do envio de protestos da Dívida Ativa aos Tabelionatos.

A Secretaria da Segurança Pública, gestão João Doria (PSDB), diz que as polícias Civil e Militar atuam diariamente para combater os crimes contra o patrimônio na região central. Com base nas análises das estatísticas e ações de inteligência, as operações, na área da 1ª Seccional Centro, são realizadas em horários alternados e com a participação de diversas viaturas e policiais. A seccional também conta com a Operação Mobile, que visa combater furtos, roubos e receptação de aparelhos celulares. Em 2020, foram apreendidos 3.307 aparelhos celulares e 205 pessoas foram presas na ação. Já no combate ao tráfico de drogas, as unidades policiais da seccional, em todo ano de 2020, apreenderam mais de 2.000 kg de entorpecentes.

A Polícia Militar atua por meio do policiamento preventivo e ostensivo, com reforço do efetivo em regiões com mais incidência de casos e quando necessário, de acordo com a análise dos índices criminais. São empenhados os programas Força Tática, Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicletas, Ronda Escolar, Radiopatrulha e Policiamento Comunitário. Além disso, diversas ações em combate ao crime são realizadas, entre elas, ponto de visibilidade, operação servir e proteger, operações de cumprimento de mandados, dentre outras.

Ressalta que o registro do boletim de ocorrência é imprescindível para a devida investigação dos fatos pela Polícia Civil e prisão dos criminosos. Além das unidades territoriais, os registros podem ser feitos pela Delegacia Eletrônica ( www.delegaciaeletronica.policiacivil.sp.gov.br).

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